domingo, 29 de maio de 2011

Fazendo cera

Ceras, isoladas ou associadas a outras substancias, tem sido empregadas para inumeras aplicacoes em praticamente todos os campos de atividade humana, desde a pre-historia. De fato, nos primeiros textos e nas primeiras obras de arte de que se tem registro utilizou-se cera de abelhas. No escopo desta postagem entretanto, vamos nos focar a alguns comentarios sobre o emprego das ceras com foco mais enderecado `as areas afeitas a seu uso no polimento de madeiras, e seu preparo domestico.

Quimicamente, as ceras sao substancias pouquissimo reagentes, quase inertes. Do ponto de vista fisico, sao maleaveis `a temperatura ambiente, e se derretem a temperaturas relativamente baixas em um liquido de baixa viscosidade; sao insoluveis ou pouquissimo soluveis, exceto em solventes nao-polares fortes, e eventualmente so a quente. A caracteristica fisica, altamente pertinente a marceneiros, que as singularizam  e' que aderem fortemente a praticamente qualquer substrato, mas quase nada a si mesmas.

Em funcao dessa sua peculiar caracteristica, aderem `a madeira com rara tenacidade. Aderem tanto que, apos aplicadas, a unica maneira de remove-las e' removendo igualmente a camada superficial do material onde foram aplicadas, com lixamento por exemplo. Como pouco, quase nada, aderem a si mesmas, podem ser polidas ate uma camada muito fina, quase totalmente transparente, muito lisa e extremamente facil de ser limpa: um grao de po caindo sobre a camada de cera tendera a se aderir a ela; como a aderencia da cera com cera e' quase inexistente, qualquer coisa, um simples passar um pano, removera o po com extrema facilidade. Como sao insoluveis `a agua, impermeabilizam a superficie que recobrem; sua inercia quimica as tornam uma barreira efetiva a reativos e pouco ou nada sensiveis `a passagem do tempo. E sao facilimas de retocar: nao e' preciso qualquer preparo alem de passar um pano seco e entao basta aplicar outra camada, polir, e pronto.

Ha ceras naturais — de origem animal, vegetal e mineral — e mais recentemente sinteticas, usualmente fabricadas utilizando polimeros de fragmentacao do polietileno. Ceras tem inumeras utilidades, incontaveis aplicacoes e pode-se dizer que praticamente, para cada uso, ha uma formulacao diferente de cera. Diferentes ceras em diferentes proporcoes, com ou sem uma infinidade de adesivos como oleos, vernizes, secantes, etc., sao oferecidas industrialmente ou preparadas oficinalmente para um vasto leque de empregos. Aqui, na esfera de fazer cera em casa, nos interessam basicamente tres: uma cera animal, a de abelhas, uma vegetal, a cera de carnauba, e uma mineral, a parafina.

Cera de abelha






A cera de abelhas pura e' apresentada mais frequentemente em blocos, sua cor varia de amarelo claro a marron profundo; e' macia e bem maleavel, so um pouco pegajosa e derrete ao redor de 63°C.






Cera de carnauba
A cera de carnauba bruta e' usualmente comercializada em escamas, a cor varia do creme palido a um denso amarelo sujo; e' muito dura (mais dura do que concreto!), nada pegajosa, e derrete ao redor de 85°C. E' praticamente insoluvel na temperatura ambiente.




A parafina vem comumente em blocos, e' branca, nao tem cheiro, e' relativamente macia, quebradica, pouco pegajosa, e derrete entre 50 e 70°C.

Parafina





A mistura dessas tres ceras em partes iguais em peso e' certamente a mais consagrada das formulacoes de cera para marcenaria, resultando um produto capaz de oferecer excelente cobertura, otima protecao e um acabamento brilhante. (E mesmo, com pequenas 'regulagens' na composicao, suficientemente flexivel para varios outros usos alem de acabamento.)

Em essencia, a maneira mais simples (tanto quanto eu saiba) de preparo consiste em liquefazer as ceras e, entao, adicionar um solvente ate obter-se a consistencia desejada.

Existem, pelo menos no mercado do Primeiro Mundo, equipamentos especificos para se derreter cera, como o ilustrado na foto `a esquerda. Talvez nao tao pratico, nem tao seguro, mas certamente bem mais barato, e' utilizar-se um banho-maria. Derretidas e bem misturadas as ceras no banho-maria, acrescenta-se entao solvente para alcancar-se a consistencia desejada do preparado quando frio, mistura-se bem, e fim.

Entre os varios solventes possiveis de ser utilizados, os de emprego mais comum sao aguarras, querosene e gasolina. Todos eles devem ter ponto de ebulicao acima de 100°C, para nao haver o risco de ferverem no banho-maria — o que representaria monumental risco de incendio. Alias, mesmo se obvio nunca e' demais lembrar: tanto as ceras, como ainda mais os solventes, sao altamente inflamaveis e, se possivel, nao se deve aquece-los com chama aberta. Em se usando chama aberta, e' muito aconselhavel deixar por perto equipamento antichamas.

Pessoalmente eu uso fogao a gas, com chama aberta portanto, e sempre que vou derreter cera deixo o extintor de incendio do carro ao lado, pronto para uso (nao custa nada, e pode representar uma IMENSA economia!). Coloco uma vasilha metalica dentro do banho-maria preparado em uma panela, adiciono as ceras devidamente pesadas e vou mexendo com um sarrafinho ate obter um liquido homogeneo. Apago o fogo, e entao adiciono terebintina, que e' o solvente que eu prefiro, mexendo sempre ate homogeneizar bem. Em seguida, despejo a cera liquida em um recepiente que feche hermeticamente, deixo aberto ate esfriar, e entao fecho.

O padrao, como mencionado, e' utilizar o mesmo peso das tres ceras. Um pouco mais de parafina, se desejado um pouco mais de brilho com polimento manual; mais cera de carnauba se for ser usada politriz eletrica (a cera de carnauba da um brilho excelente e duradouro, mas e' dura demais para ser polida `a mao). A quantidade de solvente para atingir-se a desejada consistencia vem da experiencia. Se ficar muito mole, e' deixar aberta e ir mexendo para o solvente evaporar; se muito espessa, e' adicionar um pouco mais de solvente e mexer.


Assim como ha imensa variedade na formulacao de cera, tambem ha nos metodos de preparo. Nao tenho qualquer pretensao de conhecer sequer parte consideravel deles, muito menos de saber das exatas vantagens deste ou daquele. Com sua vasta oferta de informacao os mecanismos de busca da Rede poderao atender `a curiosidade e ampliar os conhecimentos dos interessados ate a profundidade desejada. Minha sugestao e' iniciar produzindo pequenas quantidades, umas poucas dezenas de gramas. E ir experimentando.